“Dívida da Vale com Itabira não tem preço”, diz moradora em audiência na ALMG

Itabira esteve no centro do debate na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em Belo Horizonte, na noite desta segunda-feira (8). Uma audiência pública discutiu a mineração no município berço da Vale e abordou denúncias de violação dos direitos humanos e o temor da população que vive mais próximo às barragens de rejeitos.  “Estou a […]

“Dívida da Vale com Itabira não tem preço”, diz moradora em audiência na ALMG
Audiência pública ocorreu na ALMG – Foto: Divulgação/Metabase||||||||
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Itabira esteve no centro do debate na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em Belo Horizonte, na noite desta segunda-feira (8). Uma audiência pública discutiu a mineração no município berço da Vale e abordou denúncias de violação dos direitos humanos e o temor da população que vive mais próximo às barragens de rejeitos. 

“Estou a cinco minutos de uma barragem. Eu não moro em uma área de autossalvamento, que é como eles chamam, eu moro em uma área de morte”, desabafou, durante participação na audiência, a professora Maria José Araújo, moradora do bairro Conceição e integrante do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região. 

Promovida pela Comissão de Direitos Humanos, a partir de um requerimento da deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), a audiência centrou as discussões sobretudo na relação do município com a mineração da Vale. Além do temor de um rompimento de barragem, também foram debatidos temas como a dependência econômica de Itabira, o cumprimento de condicionantes e a atuação de grupos sociais, como é o comitê de atingidos. 

Participaram o padre Marco de Almeida, da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, em João Monlevade; o vereador e presidente do Sindicato Metabase de Itabira, André Viana Madeira; a integrante da Coordenação Estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens, Camila Brito; e as representantes do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região, Ana Gabriela Chaves Ferreira e Maria José Araújo.

Audiência foi realizada pela Comissão de Direitos Humanos – Foto: Divulgação/Metabase

Direito à informação

Ana Gabriela e Maria José Araújo destacaram que a população de Itabira não tem conhecimento das áreas que seriam atingidas em caso de um rompimento de barragem, as chamadas áreas de mancha. Isso também foi criticado pelo ambientalista Gustavo Torres, que usou o microfone durante o debate. “Não se pode manter sigilo sobre as informações que afetam a coletividade”, cobrou o participante. 

Para Ana Gabriela, o termo “autossalvamento” denota uma transferência de responsabilidade da Vale e do Estado, que é quem deveriam cuidar da segurança da população em caso de um colapso em barragens de mineração. Já a professora Maria José defendeu que a situação pela qual passam os vizinhos das estruturas de rejeitos é uma inversão da ordem natural dos acontecimentos. 

“Quem chegou primeiro fomos nós, os moradores. As nossas casas já estavam lá quando as barragens foram construídas. E não é fácil conviver com essa situação depois do que aconteceu em Mariana e Brumadinho”, relatou a moradora, que defendeu a remoção das pessoas localizadas nas áreas consideradas de risco. 

Condicionantes

Entre as discussões da audiência, as condicionantes impostas à Vale para liberação da Licença de Operação Corretiva (LOC) no ano 2000 também tiveram posição de destaque. Os itabiranos reclamaram, sobretudo, dos itens que tratam da necessidade de evacuação de moradores em caso de riscos e da responsabilidade da mineradora no fornecimento de água no município. 

A ativista Ana Gabriela defendeu que as operações da Vale deveriam ser interrompidas em Itabira até que seja comprovado a devida execução de todas as 51 condicionantes inseridas no texto da LOC. Ela também acusou a Câmara de Vereadores de cometer um erro ao aprovar a parceria público-privada (PPP) para captação de água no rio Tanque, alegando que este é um dever da Vale enquanto responsável pelo rebaixamento do lençol freático de Itabira. 

+ Leia mais aqui sobre as condicionantes da Vale!

A questão das condicionantes é alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara de Vereadores, proposta por André Viana. Ao ser confrontado sobre o voto favorável à PPP, o parlamentar respondeu que concordou com o projeto por causa da urgência de uma alternativa para o abastecimento de água em Itabira. Para ele, uma judicialização contra a Vale poderia demandar muito tempo e trazer problemas para o município. 

Sobre o futuro

Único político de Itabira na audiência pública em Belo Horizonte, o vereador e presidente do Metabase, André Viana, disse que a discussão sobre a atuação da Vale no município não deve se limitar aos impactos ambientais, mas também sobre os econômicos. Ele citou a projeção de exaustão da mineração até 2028 e questionou “o que vai sobrar da cidade de Itabira após o êxodo da Vale”. 

“Ficaremos só com as barragens e os problemas da mineração?”, indagou o vereador, que levou para o debate números sobre a dependência que o município tem para com a atividade extrativista. “É mais do que notório que os impactos da mineração são nocivos e, muitas vezes, irreparáveis”, completou. 

Ainda sobre a dependência econômica, Ana Gabriela chamou de “engodo” o discurso de que a Vale é importante para Itabira por causa da geração de empregos. Citando números do próprio vereador André Viana, afirmou que é baixo o percentual de 29%, entre empregos diretos e indiretos, ligados à empresa. “Gera empregos para quem?”, questionou a ativista, que ainda emendou: “A dívida da Vale com Itabira não tem preço”. 

A aposentada Maria José Araújo argumentou que a preocupação sobre o futuro de Itabira deve passar pela segurança das pessoas e não por números financeiros. “Precisamos lutar para que sejam respeitadas as vidas das pessoas que moram nessa zona de morte. Não se trata de dinheiro nem de progresso. Nossa preocupação é com as vidas. Que Itabira se vire quando a Vale for embora, ninguém vai morrer de fome”, exclamou. 

Encaminhamentos

Presidente da audiência, a deputada Beatriz Cerqueira afirmou que as empresas do setor “fazem chantagem” ao dizer que a vocação dos mineiros é a mineração. “Não são os mineiros que dependem da mineração, é a mineração que depende dos mineiros”, defendeu a parlamentar, que ainda reclamou da lentidão do Estado para promover a diversificação de sua matriz econômica. 

Ao fim da reunião, a deputada apresentou uma série de requerimentos que serão encaminhados ao plenário da ALMG para votação. Os documentos cobram a realização da audiência pública aprovada pela Câmara de Vereadores; que a Defesa Civil de Minas Gerais tornem públicas as áreas de mancha das barragens de Itabira; que a Vale forneça informações sobre as ações de segurança nas estruturas de rejeito e se pronuncie sobre as condicionantes; e, por fim, que a Assembleia Legislativa de Minas Gerais faça sua própria audiência em Itabira.

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